Hoje o nosso tema é universal: culpa materna.
Afinal de contas, isso é uma construção da cultura? Isso vem junto da identidade de mãe? Por que sentimos essa culpa? Por que nos cobramos tanto? Por que, às vezes, chegamos a pensar que não nascemos para ser mãe? Por que, às vezes, pensamos que não deveríamos ter tido nossos filhos?
Culpa materna e construção cultural
A culpa materna é uma entidade da nossa cultura, realmente. Porque construímos uma noção de especialidade. De uma incondicionalidade do amor. De um arrebatamento dessa relação em que a mãe “tem que” muitas coisas.
E nesse “tem que” é que começa a residir a culpa. Ela se manifesta de forma bem invisível. Mas, em alguns momentos ela se manifesta como um monstro. Achamos que “temos que ser” a mãe perfeita para os nossos filhos. “Temos que ser” o pai perfeito para os nossos filhos. Aqui, vou desconstruir esse mito.
A perfeição da mãe
A perfeição da mãe é uma tragédia para o filho. Porque uma mãe perfeita faz com que o filho se enxergue muito menor do que ela. E impossível de ser um adulto exercendo a vida. Ocupando os espaços dele na vida do jeito que a mãe ocupa.
Nossos filhos crescem nas nossas falhas. Quando falhamos, nossos filhos descobrem que podem ser humanos. Que eles podem ser grandiosos, mesmo errando. Ensinamos eles a reparar os erros. Isso é um detalhe muito importante!
A educação autoritária nos deixou um legado que nós “temos que ser” o tempo inteiro aquela autoridade firme. Impassível. Que não erra nunca e que se errar, não pode se abaixar para a criança e pedir desculpas. Hoje pensamos exatamente o contrário.
Humanizar a nossa figura
Devemos humanizar a nossa figura para que nossos filhos tenham acesso a todas as nossas versões na vida. É importante que os nossos filhos nos conheçam naqueles lados mais solares. Mais iluminados. E naqueles lados mais sombrios também. Porque isso vai ajudá-los a entender quais são os lados sombrios que eles terão na identidade deles. E como eles irão lidar com a vida quando eles errarem. Quando pisarem na bola. Como nós fazemos também.
A culpa das mães é uma chaga da nossa cultura. Porque ela faz com que as mães sintam que estão sempre em débito com seus filhos. Faz com que as mães sintam que estão sempre atrasadas em relação ao que os filhos merecem delas. O que precisamos pensar é que a vida é uma continuidade entre vincular-se, construir um amor, construir uma cola, ter momentos em que essa relação vai ser desconstruída, quebrada, e outros em que ela vai ser reparada.
Reparação
Então, a reparação é a palavra que eu sugiro que substituamos por culpa. Porque na hora em que percebemos que falhamos, o melhor que podemos fazer por um filho é um ritual de reparação. É conversar com ele sobre o nosso erro. Mostrando a ele como verdadeiramente nos sentimos quando erramos.
A nossa postura estará um pouco mais cabisbaixa. Talvez o nosso olhar esteja baixo também. Nossa voz mais contraída. E ele vai entender que mora ali uma pessoa que está se revisando. Que está se revisitando. Que está querendo crescer. E isso é muito bonito para um filho.
Em tantos momentos, a nossa culpa é salva com um abraço. É salva com um beijo. Às vezes, nós dois choramos. Nesse encontro, acontece muito mais do que somente a transmissão do saber viver, da autoridade. Acontece um encontro muito genuíno. E uma transformação nos dois.
Portanto, reparar uma relação vale muito mais do que ter esse fiscal correndo atrás de você dizendo a sua perfeição que não existiu. O quanto você ainda tem para caminhar pra ser perfeito.
Os nossos filhos toleram os nossos erros
Não é isso que vai construir uma relação verdadeiramente íntima com nossos filhos. Os nossos filhos toleram os nossos erros. Acompanham a nossa vida. Testemunham todas as nossas versões como ser humano. E é exatamente por isso, que quando nós acertamos e quando nós erramos, nós estamos igualmente ensinando nossos filhos a viver.