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Essa situação pode ter acontecido na vida da mulher porque ela se separou na gravidez, no puerpério ou nos primeiros meses do bebê, o que é muito comum no nosso país, e ela se vê de repente sozinha, com todas as suas dores, com todos os seus dilemas, com todas as suas perguntas.
Isso pode acontecer porque ela decidiu ser mãe, sem necessariamente a presença de um companheiro ou companheira, pode acontecer porque ela decidiu adotar uma criança. Independentemente de qual seja o contexto que construiu essa maternidade mais solitária, a solidão aparece decorrente do peso que cuidar de um bebê trás para uma pessoa só.
Eu não sei qual tem sido as experiências específicas de construir da solidão um espaço de solidariedade, fazer essa ponte, esse caminho. Mas temos visto mulheres criando seus filhos sozinha, criando alternativas coletivas para esse cuidado.
Essa é uma das experiências que essas mulheres vivem e nos ensinam muito, porque existe um provérbio africano que diz: “É necessário uma vila para criar uma criança”.
Essas realidades familiares acabam exigindo que isso aconteça com muito mais frequência, porque se ela está sozinha para cuidar de uma criança, vai precisar trabalhar, vai precisar construir o sustento para essa criança ter tudo que ela precisa e para a mulher também continuar existindo. E ela também pode querer trabalhar, porque isso faz parte dos seus desejos, faz parte da construção da sua identidade, porque isso faz bem pra ela, porque essa mulher se realiza no trabalho. E maternidade não é excludente com vida profissional em nenhum momento. Ela é uma necessidade de um rearranjo profundo, na sua disponibilidade de tempo, financeira, de energia, sendo que se ela está sozinha, isso vai ser uma conta mais difícil de fechar.
A solidão não é um destino, não é uma culpa, ela é um preconceito de um mundo que ainda não aprendeu a olhar para você do jeito que você merece ser vista.
Essa solidão é o início de uma história, de uma construção de uma rede de apoio de fortalecimento e que ela também vai se descobrir dona de muito mais poder do que imaginava antes de ser ver imersa numa coletividade maior. Existem muitas pessoas que tem construído verdadeiras comunidades de mães que estão trabalhando juntas, que realizam ‘cooworking’, mulheres que estão organizando espaços coletivos de trabalho onde elas podem levar os seus filhos e construir coisas juntas ou que se organizam em creches, que se juntam e cada dia uma vai cuidar dos filhos das outras.
Existem, também, outras possibilidades das famílias começarem a entrar nesse cuidado e isso envolve a despatologização da sua estrutura familiar, porque ver uma mulher e um filho como uma família que precisa de ajuda, significa, também, poder olhar para si de uma forma paternalista, de uma forma patriarcal e não é disso que estou falando. Estou falando que essa mulher merece ter o auxílio social para estar cada vez melhor para cuidar do seu filho.
Em alguns contextos ela está sozinha porque seu ex-companheiro está separado dela ou simplesmente abdicou da função de pai, não cumpre a função que lhe é devida. Porque pai não está no mundo para ajudar uma mulher a ser mãe, ele está para cumprir o dever dele na criação desse filho.
Quando um homem adota uma criança, quando ele cuida sozinho de uma criança ele vira notícia de jornal, ele vira manchete. Agora, quando uma mulher cuida sozinha do seu filho, ela não está fazendo mais do que a obrigação dela. Isso é patriarcado, isso é machismo. Se você vive essa situação, você sabe do que estou falando. É mais um peso sutil sobre a sua experiência.
Esse é um chamado, também, para os homens se conectarem com a necessidade de se comprometerem, com o advento da paternidade, não como uma ajuda, não como um apêndice, mas como protagonistas da criação de um filho.
Levando para si todos os ônus, também, que criar um filho trazem para qualquer pessoa. Porque muitas vezes, as carreiras que são diminuídas, que são colocadas entre parênteses, que são questionadas, que são anuladas, são as carreiras das mulheres. E as carreiras dos homens permanecem intactas sob um véu de que são eles que são os reais provedores de uma família. Isso tudo é uma construção que precisa ser desfeita, porque nós temos que construir um tecido social que ampare melhor a situação dessa mulheres e que tenha um lugar de existência digno para todas as formas de ser família. Estamos vivendo um momento de situações como as de muitas mulheres, que vive um lar monoparental, que se não olharmos para isso com nossos corações, os números continuarão crescendo e essas situações continuarão sendo cada vez mais invisíveis e perde a mãe, perde o filh@, perde essa família e perdemos nós, porque não conseguimos reconhecer a beleza de ser alguma coisa diferente do que nós somos.
Por Alexandra Coimbra Amaral, Terapeuta familiar, de casais e de grupos, fundador do Instituto Aripe. É psicólogo do programa “Encontro com Fátima Bernardes” da Rede Globo; fundador do Instituto Aripe e está conduzindo o Curso de Psicologia do Puerpério.
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Para profissionais que já trabalham com gestantes, parturientes e puérperas, estudantes das áreas de saúde; educação e ciências humanas, como formação complementar, já que é um tema quase nunca exposto nos cursos de graduação como conteúdo básico.
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Imagem: Elliana Allon